terça-feira, 5 de julho de 2011

Castaneda e a realidade


Novamente de férias voltei a ler "Uma estranha realidade" de Carlos Castaneda. Já faz um tempão que estou lendo mas... faz parte. Já estou no finalzinho desse livro que me conquistou bastante com sua magia e suas verdades percebidas nas entrelinhas, fora a percepção da estranha realidade em que vivemos. Nessa fase do livro passei por um dialogo que me chamou bastante atenção e que achei legal compartilhá-lo. É um pouco grande mas... interessante.

Boa leitura!


"-Há anos que venho realmente tentando viver de acordo com seus ensinamentos - disse eu. - Obviamente, não me saí bem. Como posso melhorar agora?


-Você pensa e fala demais. Deve parar de falar sozinho.


-O que quer dizer?


-Você fala sozinho demais. Não é só você que faz isso. Nós todos fazemos. Temos diálogos internos. Pense nisso. Sempre que está só, o que você faz?


-Converso comigo mesmo.


-Sobre o que conversa consigo?


-Não sei; sobre qualquer coisa, imagino.


-Vou lhe dizer a respeito de que conversamos conosco. Conversamos sobre nosso mundo. Na verdade, conservamos nosso mundo com nossos diálogos internos.


-Como o fazemos?


-Sempre que terminamos de falar conosco, o mundo está sempre como devia ser. Nós o renovamos, o animamos com vida, o mantemos com nosso diálogo interno. Não só isso, mas também escolhemos nossos caminhos ao conversarmos conosco. Assim, repetimos as mesmas escolhas várias vezes até o dia da nossa morte, pois ficamos repetindo o mesmo diálogo interno a vida toda, até o fim. Um guerreiro sabe disso e procura parar de falar. Esse é o último item que você tem de aprender se quiser viver como um guerreiro.


-Como posso deixar de conversar comigo mesmo?


-Antes de tudo, tem de usar os ouvidos para aliviar um pouco a carga dos seus olhos. Usamos os olhos para julgar o mundo desde o dia em que nascemos. Falamos com os outros e conosco sobretudo sobre o que vemos. Um guerreiro sabe disso e escuta o mundo; escuta os sons do mundo.

Guardei minhas notas. Dom Juan riu e disse que não queria que eu fizesse uma coisa forçada, que escutar os sons do mundo tinha de ser feito harmoniosamente e com muita paciência.
-Um guerreiro sabe que o mundo se modificará assim que ele parar de conversar consigo mesmo - disse ele -, e deve estar preparado para esse abalo monumental.

-O que quer dizer, Dom Juan?

-O mundo é assim e assim, e tal e tal, só porque nos dizemos que é dessa maneira. Se pararmos de nos dizer que o mundo é tal e tal, ele deixará de ser tal e tal. Neste momento, não creio que você esteja pronto para esse golpe monumental, e, portanto, deve começar lentamente a desfazer o mundo.

-Não compreendo mesmo!

-Seu problema é que confunde o mundo com o que as pessoas fazem. Ainda nisso, não é o único. Todos nós fazemos isso. As coisas que as pessoas fazem são os escudos contra as forças que nos cercam, também nos dão conforto e nos fazem sentir seguros; o que as pessoas fazem é muito importante em si, mas apenas como escudo. Nunca aprendemos que as coisas que fazemos como pessoas são apenas escudos e deixamos que elas dominem e transtornem nossas vidas. Na verdade, eu diria que, para a humanidade, aquilo que as pessoas fazem é maior e mais importante do que o próprio mundo.

-O que é que você chama de mundo?

-O mundo é tudo o que está encerrado aqui - disse ele, pisando com força no chão. - A vida, a morte, pessoas, aliados e tudo o mais que nos cerca. O mundo é incompreensível. Nunca o compreenderemos; nunca desvendaremos seus segredos. Assim, temos de tratá-lo como ele é, um simples mistério!

"Mas o homem comum não faz isso. O mundo nunca é mistério para ele e, quando ele chega à velhice, está convencido de que não tem mais nada por que viver. Um velho não esgotou o mundo. Só esgotou o que as pessoas fazem. Mas, em sua estúpida confusão, acredita que o mundo não tem mais mistérios para ele. Que preço triste para pagar por nossos escudos!

"Um guerreiro sabe dessa confusão e aprende a tratar tudo direito. As coisas que as pessoas fazem não podem, de jeito nenhum, ser mais importantes do que o mundo. E assim o guerreiro trata o mundo como um mistério infindável e o que as pessoas fazem como uma loucura sem fim.


Pouco tempo antes conversava sobre o que é real nesse mundo e o que não é. Só depois desse trecho compreendi, pelo menos acho que compreendi, o que realmente isso quer dizer. O que vivemos é realmente uma loucura, precisamos de muito menos do que realmente achamos e vivemos exatamente uma ilusão sem fim. E mais... não estamos preparados para viver a verdade.

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